O naufragio
O Titanic saiu de Belfast para Nova York mas no caminho colidiu com um iceberg. O nvio conciderado "inafundavel" depois de cinco dias estava se enchendo de água.
As 11H 40 min Fleet divisa subitamente alguma coisa à frente.Era
pequena (o tamanho lhe pareceu de aproximadamente duas mesas juntas )
mas de instante em instante ficava maior e mais próxima. Tocou
prontamente o sino de alarme, tirou o fone do gancho e ligou para a
ponte.
-O que foi que você viu? - Perguntou uma voz calma do outro lado da linha.
-Um iceberg bem à proa - respondeu Fleet.
-Obrigado - murmurou cortesmente a voz.
Durante os 37 segundos
seguintes Fleet viu o iceberg se aproximar. Estavam quase em cima dele e
o navio ainda não havia mudado de rumo. O iceberg, de uns 30 metros de
altura, erguia-se úmido do castelo de proa. Fleet segurou-se ante a
eminência de uma colisão. Mas, milagrosamente, a proa começou a guinar
para bombordo. No
último segundo, o navio aproou para o espaço livre e o iceberg deslizou
por estibordo. Fleet teve a impressão de que haviam escapado por pouco. No salão de jantar da primeira classe, ouve a impressão de um
leve ruído rascante vindo de algum ponto bem no fundo do navio.
No alto da ponte de
comando, o Primeiro Oficial William Murdoch havia levado a manivela da
casa de máquinas para a posição “Pare”.
Murdoch estava no comando da ponte e competia-lhe tomar providência,
dado que Fleet dera o aviso por telefone. Agira com rapidez, mas era
muito tarde.
Quando o barulho da colisão se extinguiu, o Capitão Edward Smith, comandante do navio, correu de seu camarote para a ponte.
-Que foi isso, Sr. Murdoch?
-Um iceberg, comandante. Virei para bombordo, inverti a marcha das máquinas, mas estava muito perto. Não pude fazer mais.
-Feche as portas de emergência.
-Já estão fechadas comandante.
Estavam
realmente fechadas. Em baixo, na casa das caldeiras Nº 6, o foguista
Fred Barret falava com o segundo maquinista-assistente quando se acendeu
a luz vermelha de emergência.
De
repente, houve um barulho ensurdecedor e todo o estibordo do navio
pareceu despedaçar-se. Enquanto o mar entrava em catadupas, cachoando em
torno dos canos e das válvulas, os dois homens pularam para a saída e a
porta de emergência desceu atrás deles como um machado.
Nas
casas das caldeiras mais à proa, os homens abalados pelo choque,
gritavam uns para os outros querendo saber o que havia acontecido.
Espalhou-se a notícia de que o Titanic havia encalhado nos Bancos da
Terra Nova. Muitos ainda pensavam assim, mesmo depois que um encarregado
da carga apareceu descendo as escadas gritando:
-Epa! Batemos num iceberg!
Depois de 11:30alguns dos passageiros
se vestiram e subiram para o convés. O
Titanic estava parado no meio do mar, enquanto três de suas quatro
enormes chaminés expeliam vapor com uma zoada que perturbava a noite
tranqüila. Afora isso, tudo era normal. Quando a notícia do acidente se espalhou, ninguém ficou alarmado.
-Sabe o que foi? – perguntou Harry Collyer à sua esposa, quando voltou ao camarote.
-Batemos num iceberg, mas não há perigo. Um oficial me disse.
A Srª Collyer perguntou ao marido se havia alguém amedrontado. Quando soube que não, tornou a deitar-se.
O
casal Dickinson Bishop também não se perturbou. Quando um comissário de
convés lhes assegurou que tinham apenas batido num pedacinho de gelo
que já ficara para trás, os Bishops voltaram ao seu camarote e trocaram
novamente a roupa.
No alto da ponte, o Comandante Smith procurava juntar todos os
fragmentos do quadro. Ninguém podia estar mais habilitado para isso do
que ele. Depois de 38 anos de serviço na White Star Line, ele não era
apenas o comandante mais antigo da companhia, mas um patriarca barbado
que tanto os tripulantes quanto os passageiros adoravam. Aquela ia ser a
sua última viagem.
Smith voltou-se para o Quarto Oficial Joseph Groves Boxhall e disse-lhe:
-Procure o carpinteiro e mande-o sondar o navio.
Boxhall
acabava de descer as escadas da ponte de comando, esbarrou-se com J.
Hutchinson, o carpinteiro, que já ia subindo às carreiras. Hutchinson,
ao passar por ele, exclamou ofegante:
-O navio está fazendo água muito depressa.
Logo depois chegou
Bruce Ismay. Vestira um terno por cima do pijama e subira à ponte para
perguntar se estava acontecendo alguma coisa que o presidente da
companhia devesse saber. O Comandante Smith deu-lhe a notícia do
iceberg.
-Acha que o navio está seriamente danificado? _ perguntou Ismay.
Houve uma pausa e afinal o comandante respondeu em voz lenta:
-Creio que sim.
Não
tardaria que soubessem com certeza. Haviam mandado chamar Thomas
Andrews, construtor do Titanic, que fazia a viagem com o intuito de
corrigir quaisquer defeitos que surgissem. Se alguém podia avaliar a
situação, era ele.
Daí
a pouco, Andrews e o comandante iniciavam a sua inspeção, descendo pela
escada reservada à tripulação para não chamarem atenção... Pelo
labirinto dos corredores bem abaixo...beirando a água escachoava pela
quadra de squash-ball, onde o mar agora batia de encontro a tabela.
Voltando
para a ponte, passaram pelo salão do Convés A, lotado de passageiros.
Todo mundo observou a fisionomia dos dois homens, para saber se as
notícias eram boas ou más. Ninguém pode perceber nada.
Enquanto
isso, no Convés A, o Major Arthur Peuchen notou um fato curioso.
Enquanto olhava os passageiros que se divertiam com o gelo, sentiu uma
leve inclinação no convés.
-O navio está adernando! – exclamou ele para um companheiro.
-Mas não é possível! O mar está perfeitamente calmo e o navio parou.
-Ninguém pode afundar este navio – replicou placidamente o outro homem.
Houve
mais pessoas que sentiram a inclinação para a proa, mas parecia
indiscrição falar nisso. Entretanto, na ponte de comando, os
instrumentos mostravam que o Titanic estava um pouco inclinado para a
proa e adernando cinco graus para estibordo.
Perto
dali, Andrews e o Comandante Smith faziam os cálculos. Água no porão de
proa... No porão Nº 1... no porão Nº 2...no correio...na casa de
caldeiras Nº 6. Somando tudo, os fatos mostravam que havia um rombo de
90 metros, com os primeiros cinco compartimentos irremediavelmente
invadidos pela água. Que
queria dizer isso? Andrews explicou calmamente. O Titanic podia flutuar
com três dos quatro compartimentos inundados. Poderia flutuar até com
os quatro compartimentos perdidos. Mas fosse qual fosse à maneira como
se raciocinasse, ele não poderia flutuar com os cinco compartimentos
cheios de água. A
divisão entre o quinto compartimento e o sexto só ia até o convés E. Se
os primeiros cinco compartimentos fossem inundados, a proa desceria
tanto que a água do primeiro compartimento transbordaria para o sexto.
Quando este estivesse cheio, transbordaria para o sétimo e assim por
diante. Era uma questão de certeza matemática. Não havia solução.
Há 00:05 o Comandante Smith deu ordem
para que os botes fossem descobertos e os passageiros acordados e
reunidos. Depois, desceu pelo convés dos botes para a cabine do
radiotelegrafista.
O radiotelegrafista John Philips tivera um dia de muito trabalho.
Em 1912 a radiotelegrafia ainda era uma novidade e os passageiros não
podiam resistir à tentação de mandar mensagens frívolas para os amigos.
Todo aquele domingo os radiotelegramas se haviam empilhado na cesta para
serem transmitidos. Uma hora antes quando Philips conseguira afinal um bom contato com o
Cabo Race, na Terra Nova o Californian interrompeu rudemente com um
aviso sobre gelo. Falava de tão perto que quase explodiu nos ouvidos de
Philips. Não era de admirar que ele houvesse respondido:
-Pare com isso que estou ocupado!
O Comandante Smith apareceu e disse:
-Batemos em um iceberg. Prepare-se para transmitir um pedido de socorro, mas não transmita enquanto eu não mandar.
Voltou daí alguns minutos e disse a Philips, entregando-lhe um pedaço de papel com a posição do Titanic:
-Transmita o pedido de socorro!
À
meia noite e quinze, Philips começou a manipular as letras CQD –
naquela época o sinal regulamentar de socorro – seguidas de MGY. O sinal
de chamada do Titanic. O sinal foi repetidamente lançado dentro da
noite.
Passava pouco da meia noite e quinze. No
salão de fumar do Titanic o jogo de bridge estava de novo em plena
animação, quando um oficial de bordo, apareceu à porta, dizendo:
-Cavalheiros, vistam os salva-vidas. Há uma anormalidade.
Em
baixo, no alojamento da tripulação, o eletricista Samuel Hemming subiu
para seu beliche, convencido de que o som sibilante que ouvira no convés
de proa não tinha muita importância. Já estava quase pegando no sono
quando o carpinteiro do navio se inclinou sobre o beliche dizendo:
"Se eu fosse você, me levantaria. O navio está fazendo água nos porões 1,2 e 3 e a quadra de squash está enchendo!". No camarote de primeira classe, a Srª Lucien Smith drmia.
De repente, as luzes se acenderam e ela viu o marido de pé junto à cama,
sorrindo. Informou sem pressa:
- Batemos em um iceberg. Isso não tem muita importância, mas por simples
formalidade o comandante mandou que todas as mulheres e crianças fossem
para o convés.
E
assim se passavam as coisas. Não houve toques de sinetas, nem de
sirenes nem alarme geral. Mas em todo o Titanic, desta ou daquela
maneira, a ordem foi transmitida.
Naquele
tempo um comissário num navio de luxo se encarregava apenas de oito a
nove camarotes e era cheio de cuidados com seus passageiros.
No
B 84, o comissário Harry Etches trabalhava como um alfaiate paciente,
ajustando Benjamin Guggenheim, o rei da exploração de minas, ao seu
salva-vidas. Guggenheim queria ir para o convés vestido como estava, mas
Eatches o fez enfiar um grosso suéter antes de mandá-lo que o homem que
estava lá dentro pudesse sair. Nesse momento, apareceu um comissário
com ameaças de prender todo mundo quando o Titanic chegasse à Nova York
para cima.
Era
difícil decidir entre a piada e a seriedade. A porta de um camarote
emperrou e alguns passageiros arrombaram para que o homem que estava lá
dentro pudesse sair. Nesse momento apareceu um camareiro com ameaças de
prender todo mundo quando o Titanic chegasse a New York pelos danos
materiais causados à companhia.Aos
poucos os passageiros foram se aprontando e subindo as escadas aos
montes. Estavam vestidos da maneira mais disparatada. Por baixo do
sobretudo, o jovem Jack Thayer vestia um terno de tweed com colete e
ainda outro colete de pelo de cabra por baixo.
Robert Daniel, banqueiro da Filadélfia, estava apenas com um pijama de lã.
A multidão corria
dentro da noite gelada. Cada classe conservava-se no seu convés próprio –
a primeira classe no centro do navio, a segunda um pouco à ré e a
terceira na proa ou no convés das bombas, perto da proa. Todos esperavam
em silêncio as ordens seguintes, confiantes, mas vagamente preocupados.
Havia
algumas piadas um pouco forçadas. Quando o Coronel Achibald Gracie viu
Fred Wright, profissional de squash do Titanic, lembrou-se de que havia
reservado a quadra para as sete e meia da manhã.
-Não é melhor cancelarmos aquela reserva? – perguntou Gracie.
-É sim – respondeu Wright sem entusiasmo. Ele sabia que a água já havia passado do teto da quadra de squash.
Enquanto
os passageiros conversavam e esperavam, a tripulação se dirigiu
prontamente para a coberta dos botes e começou a aprestar os 16 botes de
madeira. Havia oito de cada lado. Os barcos de bombordo tinham números
pares; os de estibordo, ímpares. Havia ainda quatro barcos dobráveis de
lona, marcados com as letras A, B, C e D, que estavam apoiados sobre as
cabines dos oficiais.
Havia
2.207 pessoas a bordo do Titanic naquela noite. Todos os botes do navio
poderiam transportar apenas 1.178. Essa desproporção não era do
conhecimento de nenhum dos passageiros e poucos tripulantes estavam a
par disso; de qualquer maneira, porém, a maioria não teria dado a menor
importância ao fato.
Por
isso, os passageiros estavam no convés dos botes, calmos embora
confusos. Não se fizera um só exercício de salvamento. Os passageiros
não sabiam a que botes se dirigirem. Os tripulantes tinham sido
escalados, mas poucos se deram ao trabalho de olhar a lista. Entretanto,
eles pareciam adivinhar onde eram necessários e, um por um, os botes
foram colocados em posição.
Com um pé no bote Nº 6 e
outro no convés, Charles Lightoller chamou as mulheres e crianças. A reação
nada teve de entusiástica. Por que trocar os iluminados conveses do
Titanic por horas de escuridão dentro de um bote a remos? Até John Jacob
Astor criticou a idéia, dizendo:
-Estamos em mais segurança aqui do que dentro daquele pequeno bote.
Quando a Srª White embarcou, uma pessoa amiga lhe disse:
-Quando voltar amanhã, vai ter que pagar passagem. Não se pode entrar novamente sem um passe.
A Srª Constance Willard se recusou terminantemente a embarcar no bote. Afinal, um oficial exasperado desistiu, exclamando:
-Não percam tempo. Se ela não quiser entrar, que fique!
Também
havia música para acalmar os passageiros. O maestro da orquestra
Wallace Hartley reunira os seus músicos e a orquestra tocava números
variados. O aspecto do conjunto era um pouco estranho – alguns estavam
com os casacos azuis do uniforme, outros de paletó branco – mas a música
era estrepitosa e alegre.
A estibordo as coisas
corriam com um pouco mais de rapidez. O Terceiro Oficial Herbert John
Pitman, encarregado do Bote Nº 5, chamava:
_ Vamos, minhas senhoras!
E
uma a uma elas subiam nos botes. Quando não havia mais mulheres e
crianças que quisessem ir sozinhas, permitiu-se o embarque de alguns
casais. Depois, embarcaram alguns homens sozinhos. A estibordo foi essa a
regra durante toda a noite – primeiro mulheres e crianças – e os homens
se ainda houvesse lugar.
À
ré, o Primeiro Oficial Murdoch estava encontrando dificuldade em lotar o
seu bote. Afinal, embora houvesse apenas cerca de 20 pessoas a bordo,
achou que não podia esperar mais. Aos 45 minutos depois da meia-noite
deu sinal para arriarem o Nº 7 – o primeiro bote a baixar. Em seguida, o Nº 5 começou a descer rangendo. O presidente Bruce Ismay, da White Star Line, surgiu agitado; parecia for a de si.
_ Desçam! Desçam! _ repetia ele desvairado, agitando um dos braços, enquanto que com o outro se agarrava ao bote.
Enquanto isso, na
cabine de telégrafo, Phillips estava recebendo as respostas de socorro.
As notícias eram animadoras. O primeiro que respondeu foi o vapor
Frankfort, da North Deutch Lloyd, que transmitiu um seco: “OK. Fique na
escuta”, mas não comunicou a sua posição. Dentro em pouco, chegavam
outras confirmações. A
notícia da tragédia do Titanic se difundia cada vez mais. Navios que
estavam fora de alcance recebiam a notícia dos mais próximos. O Cape
Race ouviu a notícia diretamente e a transmitiu para terra No
alto do Edifício Wanamaker, em New York, um jovem radiotelegrafista
chamado David Sarnoff captou um sinal fraco e também o passou a diante. O
mundo inteiro se levantou em atormentada expectativa. Entretanto,
bem perto, o vapor Carpathia, da Cunad Line, navegava para o sul na
mais completa ignorância do que estava acontecendo.
O gesto cortês do
Carpathia foi cortado pela resposta de Philips: “Venha imediatamente.
Batemos num iceberg. Isto é um CQD, meu velho. Posição 41, 46 N 50, 14
W.”
Depois
de um instante de atônito silêncio, Cottam correu para dizer ao
comandante. Após alguns minutos, transmitiu boas notícias: o Carpathia
estava a apenas 58 milhas (107 km ) de distância e navegava a todo
vapor. Enquanto
Philips procurava apressar os navios mais próximos, o segundo
radiotelegrafista Harold Bride teve uma idéia. CQD era o pedido de
socorro tradicional, mas uma convenção internacional resolvera pouco
antes usar de preferência as letras SOS, que eram mais fáceis de ser
captadas pelo mais inexperiente amador.
_ Transmita um SOS – sugeriu Bride. – talvez seja sua última oportunidade de transmiti-lo. Philips riu e ligou o aparelho. À meia noite e 45 o Titanic expediu o primeiro SOS.
A inclinação do convés
era mais acentuada e o tempo estava visivelmente se esgotando. Thomas
Andrews, o construtor naval, corria de bote em bote, apressando as
mulheres.
-É preciso embarcar quanto antes minhas senhoras. Não há um momento só a perder.
Os
botes foram descidos sucessivamente e com presteza – o Nº 6, aos 55
minutos depois da meia noite; o Nº 3 a 1 hora da madrugada; o Nº 8 à 1h
10 min. Na ponte, o Quarto Oficial Boxhall soltava mais foguetes, mas
não acreditava ainda no que estava acontecendo.
-Comandante – perguntou ele – a situação é mesmo grave?
-Disse-me o Sr. Andrews – respondeu Smith calmamente – que dá ao navio de uma hora à uma hora e meia.
No convés dos botes o ritmo do salvamento se tornara mais acelerado e... Mas desordenado.
Em seguida, fez sinal
aos homens que manobravam os botes e eles baixaram o Nº 1, que tinha
capacidade para 40 pessoas – com exatamente 12 pessoas a bordo. Em
baixo, na terceira classe, estavam aqueles que não tiveram nem a
oportunidade de perder o Nº 1. Um enxame de mulheres se agitava nos pés
da escadaria principal da terceira classe no convés E. Bloqueados uns
pelos outros, barulhentos e aflitos, ali estavam desde que os empregados
de bordo os haviam feito levantar-se. À
meia noite e trinta, chegou ordem de mandar as mulheres e as crianças
para o convés dos botes. Não se podia esperar que acertassem sozinhos
com o caminho por entre o labirinto de corredores que normalmente
isolavam a terceira classe. Diante
disso, o comissário John Hart resolveu guia-los, levando-os em grupos.
Organizou um grupo e levou até ao bote Nº 8. Mas logo que fazia as
pessoas entrarem elas pulavam fora e iam pra dentro, onde não fazia
frio. Só houve tempo para guiar mais um grupo. Depois disso, Murdoch deu
ordem a Hart de embarcar num bote. Muitos dos passageiros da terceira classe, com o acesso impedido ao resto do navio, estavam inteiramente entregues à sorte. Como uma coluna de formigas, uma pequena fila deles subiu por um
guindaste no convés C de ré e rastejou pelo mastro do guindaste até a
primeira classe, de onde, transpondo a amurada, passou para o convés dos
botes. Outros batiam nas portas, exigindo que os deixassem passar.
Na ponte do
Californian, o Segundo Oficial Herbert Stone contava os foguetes – seis
até uma hora. À 1h 10 min, Stone comunicou o fato pelo tubo acústico ao
Comandante Lord, que perguntou:
_ São sinais da companhia?
_ Não sei – respondeu Stone.- Parece que são foguetes brancos.
O Comandante recomendou-lhe que procurasse entrar em contato com o navio pelo telégrafo luminoso.
Pouco depois, Stone entregou o seu binóculo ao aprendiz Gibson, dizendo:
_ Observe o navio agora. Está muito esquisito.
Gibson
olhou o navio atentamente. Parecia estar adernando e tinha, como ele
disse “uma grande parte fora da água”. Stone notou que a luz vermelha
lateral havia desaparecido.
A
posição do Titanic estava realmente esquisita. O mar já batia acima do
convés C na proa, marulhando em torno dos guindastes e das escotilhas,
lambendo a base da superestrutura. Adernava acentuadamente para
bombordo.
À 1h 40 min mais ou menos, o Oficial Chefe Wilde gritou:
_ Todo mundo a estibordo para equilibrar o navio!
Os
passageiros e a tripulação concordaram e o Titanic virou-se lentamente
de novo em posição de equilíbrio. O trabalho de salvamento nos botes foi
reiniciado.
Não havia mais
dificuldade em convencer as pessoas a abandonarem o navio. Um passageiro
da terceira classe pulou dentro de um barco que se balançava,
juntamente com vários outros homens. Quase todos foram retirados à
força, mas o primeiro escondeu-se ali, coberto por um xale de mulher.
Disse ele depois que foi a Srª Astor que o cobriu com o xale.
Em
outro ponto, uma onda de homens tentou assaltar o bote Nº 14, mas o
marinheiro Joseph Scarrott os rechaçou com a cana do leme. O Quinto
Oficial Lowe puxou a pistola e gritou:
_ Se alguém mais tentar isso, levará bala! – e disparou ao longo do navio enquanto o bote Nº 14 descia ao mar.
Enquanto
isso, o barco de lona C era ajustado nos turcos e estava sendo
carregado. O presidente Bruce Ismay Ajudou a aprontar o bote para ser
arriado. Já estava mais calmo e parecia sob todos os aspectos um membro
da tripulação do Titanic. Mas, de repente, no último instante, pulou
para dentro do bote era mais um passageiro apavorado. Outros
se portavam diferentemente. O jornalista William Stead, independente
como sempre, estava lendo sozinho no salão de fumar da primeira classe. O
bombeiro George Kemish, ao passar, teve a impressão de que ele
pretendia ficar ali acontecesse o que acontecesse.
Benjamin Guggenheim dirigiu uma senhora que entrava num bote a seguinte mensagem de despedida:
-Se alguma coisa me acontecer diga a minha mulher que eu fiz tudo o que era possível para cumprir o meu dever.
De
fato, Benjamin Guggenheim quase se superou. O seu suéter e o seu salva vidas haviam desaparecido. Ele e o seu criado de quarto estavam
impecavelmente vestidos a rigor.
-Vestimo-nos da melhor maneira – explicou ele – e estamos prontos para ir pra o fundo do mar como cavalheiros.
Archibald
Gracie e mais uma dezena de outros passageiros de primeira classe
trabalhavam juntamente com a tripulação, carregando os últimos botes.
Quando ajudaram a Srª Constance Willard, sorriram e disseram-lhe que
tivesse sorte e coragem. Ela notou que as suas frontes mostravam grandes riscos de suor. Só
restavam alguns botes. Os barcos de lona A e B estavam amarrados no
alojamento dos oficiais e os homens estavam encontrando grande
dificuldade em tirá-los de lá. Contudo, o barco D já fora ajustado nos
turcos e estava pronto para ser carregado. Não havia tempo a perder. As
luzes começavam a ficar vermelhas. Ouvia-se ao longe em baixo o barulho
de louça que se quebrava.
Lightoller
não facilitou: 47 lugares – 1.600 pessoas. Mandou os marinheiros
fazerem com os braços um amplo círculo em torno do bote, deixando as
mulheres passarem.
O Coronel Gracie
apareceu apressadamente com a Srª Murray Brown e a Srª Edith Evans.
Chegaram ao bote D quando este estava começando a descer. Edith Evans se
voltou para a Srª Brown e disse:
- A senhora primeiro, que tem filhos que a esperam em casa.
Ajudou
prontamente a Srª Brown a transpor a amurada. Nesse momento, alguém
gritou que baixassem e às 2h 5 min o bote D – o último bote que foi
lançado ao mar – começou a descer. Evans ainda estava no convés.
Depois
que os botes se foram uma estranha calma caiu sobre o Titanic. As
centenas de pessoas que haviam ficado conservavam-se calmamente nos
conveses superiores, afastando-se da amurada. Jack Thayer, olhando para
um par de turcos vazio, pensava em todas as alegrias que tivera na vida.
Pensava no pai, na mãe, nas irmãs, no irmão. Sentia-se longe, como se estivesse vendo tudo de algum lugar remoto.
Às 2h 5 min o Comandante Smith entrou pela última vez na cabine de rádio e disse:
-Senhores, já cumpriram plenamente o seu dever. Cuidem agora de salvar-se. Eu os dispenso.
Depois se dirigiu ao convés dos botes e disse a tripulação:
-Muito bem, rapazes. Salve-se quem puder.
Alguns
dos marinheiros seguiram literalmente as palavras do Comandante Smith,
jogaram-se ao mar e foram recolhidos pelos botes. Mas a maior parte
conservou-se a bordo. Espalhados pelo convés dos botes, cerca de 15
serventes da primeira classe estavam indolentemente à vontade. Pareciam
contentes com o fato de ninguém se incomodar mais que eles fumassem.
Perto da entrada para a Grande Escadaria, a orquestra com coletes salva
vidas por cima dos sobretudos, continuava a tocar.
No
interior do navio, o pesado silêncio das salas vazias era um drama em
si mesmo. Os lustres de cristal do restaurante estavam inclinados num
ângulo impossível, mas ainda brilhavam firmemente, iluminando os lambris
de nogueira e os tapetes róseos. O
Lounge, em estilo Luis XV, com sua enorme lareira, estava silencioso e
deserto. O Palm Court também estava deserto. Era difícil acreditar que
apenas quatro horas antes estivesse cheio de senhoras e cavalheiros
elegantemente vestidos a escutar música. O
salão de fumar, porém, não estava completamente deserto. Quando um
comissário espiou para dentro às 2h 10 min, ficou surpreso de ver Thomas
Andrews ali sozinho. O salva-vidas de Andrews estava jogado em cima de uma mesa de jogo. O
homem tinha os braços cruzados sobre o peito e um ar de atordoamento.
Quando o comissário perguntou:
-Não vai tentar salvar-se, Sr. Andrews? – não houve resposta e nem sequer um sinal de que ele ouvira.
Nos conveses, a multidão esperava. Alguns rezavam em companhia do passageiro reverendo Thomas Byles. Outros pareciam perdidos em seus próprios pensamentos. Havia muito em que se pensar.
Para
o Comandante Smith, havia os cinco avisos sobre gelo recebidos de
outros navios durante o dia. O último dissera exatamente onde deveria se
localizar o iceberg. Havia ainda o termômetro que caíra 6 graus acima
de zero às 7 horas para zero grau às 10h 30 min. O
radiotelegrafista poderia refletir quanto ao sexto aviso sobre o gelo,
quando o Californian havia interferido e Phillips o mandara calar-se.
Esse último aviso nem chegara á ponte de comando. Numa
ocasião como aquela havia também pequenas coisas que podiam atormentar
uma pessoa. Edith Evans lembrava-se de um adivinho que lhe recomendara
“cuidado com a água”. Charles Hayes lembrava-se. De que, poucas horas
antes, profetizara para breve “a maior e mais pavorosa das catástrofes
marítimas”.
Em
cima do alojamento dos oficiais alguns homens procuravam
desesperadamente livrar os botes de lona A e B. No lado de bombordo,
conseguiram empurrar o bote B até a beira do teto e faze-lo deslizar
sobre alguns remos até o convés, onde ele caiu emborcado. O
bote A também estava dando trabalho. Alguém meteu algumas tábuas contra
a parede e afinal o bote ficou solto e foi descendo de proa.
Mas o Titanic estava tão adernado que não conseguiram empurra-lo para cima até a beira do convés.
Quando o comissário
Edward Brown se esforçava para levar o bote A até a borda do convés,
percebeu de súbito que já não era preciso. O bote estava flutuando.
Brown pulou dentro, cortou as amarras e o bote foi imediatamente arrastado para o mar.
De
cima do alojamento dos oficiais, Lightoller viu a onda viu a onda
varrer a proa. Viu gente recuando ante ela. Os mais ágeis conseguiam
livrar-se, os mais lentos eram alcançados e envolvidos.
Sabendo
que a fuga só serviria para prolongar a agonia, Lightoller voltou-se
para a proa e mergulhou. Durante um terrível minuto, ficou comprimido de
encontro à abertura de um ventilador, pelo qual se derramava a água.
Depois uma lufada de ar quente o arrojou à superfície. Ofegante e a
cuspir água, afastou-se a nado.
Harold
Bride também não perdeu a calma. Quando a onda passou, ele agarrou a
borda do bote B e juntamente com uma dezena de pessoas foi arrastado com
o bote.
No
turbilhão de cordas, equipamento náutico e águas em torvelinho ninguém
sabia do que acontecera à maior parte dos outros. Podiam ser vistos dos
botes, agarrando-se como enxames de abelhas às estruturas dos
tombadilhos, aos guinchos, aos ventiladores. Mas de perto era difícil
ver o que estava acontecendo, muito embora, por mais incrível que fosse,
as luzes ainda estivessem acesas, lançando um clarão mortiço.
Ninguém
sabe o que aconteceu ao Capitão Smith. Mais tarde se disse que ele se
suicidara, mas não há a menor prova disso. Pouco antes do fim, o
comissário Brown viu-o encaminhar-se para a ponte, ainda empunhando o
megafone. Depois que o Titanic afundou, o foguista Harry Sênior o viu
sobre a água segurando uma criança.
A inclinação aumentou e a chaminé de vante caiu, batendo na água com uma chuva de fagulhas.
O Titanic estava agora em posição absolutamente perpendicular. Da
terceira chaminé para a popa o navio se elevava no ar, com as três
hélices brilhando.
Vistos
e não vistos, pessoas famosas e gente desconhecida rolaram num montão
quando a popa elevou mais. Os acordes do hino episcopal “Outono” foram
sepultados numa pilha de músicos e instrumentos.
As luzes se apagaram, brilharam de novo e cessaram de vez. Uma única lâmpada de querosene ainda bruxuleava do mastro de ré.
Um
barulho surdo reboava através da água, enquanto tudo se quebrava e
desprendia. Nunca houve uma mistura como aquela – 29 caldeiras... 800
caixas de nozes descascadas... Grandes correntes de âncora ( cada elo
pesava quase 80 quilos )... 15.000 garrafas de cerveja... Enxoval de
Eleanor Widener... A caixa de metal do Major Arthur Peuchen... Dezenas
de palmeiras em vasos... Cinco pianos de cauda.Os
que estavam nos botes mal podiam acreditar no que viam. Durante duas
horas tinham visto, ainda animados por uma esperança que resistia à
lógica, o Titanic afundar cada vez mais. Quando
a água atingiu os sinalizadores vermelho e verde, convenceram de que o
fim não tardava. Mas ninguém sonhava que seriam assim – o fantástico
rumor, o casco negro num ângulo de 90 graus, as estrelas brilhando ao
fundo como numa paisagem de cartão de Natal.
Dois
minutos se passaram. O rumor cessou e o Titanic desceu um pouco do lado
da popa. Começou a afundar pouco a pouco, numa inclinação aguda.
De repente, pareceu ganhar velocidade. Por fim, o mar se fechou sobre o mastro da bandeira da popa.
Nos botes, as mulheres se quedavam aturdidas e silenciosas. No bote Nº 5, o Terceiro Oficial Pitman olhou o relógio e anunciou:
-São 2h 20 min